O Nascimento do Rock'n'Roll como o conhecemos
Agosto de 1954, o rock'n'roll, mais um ritmo de dança, uma dance craze, do que um propriamente uma linguagem musical, tinha acabado de tomar conta da América, da juventude americana, mais rica, mais desiludida e mais ociosa que o país jamais conheceu. Elvis Presley ainda não sabia, mas ele tinha todos os elementos para se colocar na frente, no alto dessa loucura americana e dar-lhe um caráter próprio, definitivo. Era jovem, pobre e ambicioso. Tinha uma voz potente, elástica e maleável como poucos cantores. Era uma figura bonita, machona, sexy, com gosto exótico, misto de caipira e criolo. E, o principal, possuía uma capacidade, quase orgânica, fisiológica, para aprender, compreender e moldar todos os principais elementos rítmicos e melódicos da música americana, fosse Hillbilly, Blues rural, country & Western, balada pop, That's what rock'n'roll is all about.
No entanto, muito compreensivelmente, a série de cinco avulsos que a Sun Records produziu com Elvis foi destinada em sua maior parte ao público country. Destino natural para um artista sediado em Memphis, capital mundial do country. De um lado, Elvis gravava sempre uma canção com sabor country & western e do outro sempre vinha um rythm blues. Em todos, Elvis subvertia o esperado: cantava o blues como um caipira, cantava o country como um negro, ou fundia as duas coisas num sincopado novo. Todos os cinco avulsos foram imediatos e fulminantes sucessos locais, na área que vai de Memphis a Nashville. Primeiro tocavam só em rádios de negros. Mas depois que, Elvis garantiu que estudara na Humes High School, uma escola só para brancos, s explosão foi incontrolável. Logo após o primeiro avulso, Elvis se demitiu da firma de utensílios elétricos e começou a carreira na estrada. Seu empresário era o próprio guitarrista Scotty Moore, e no começo não foi muito fácil vender o show de Elvis no circuito country. A lei de integração racial nas escolas tinha acabado de entrar em vigor, e era uma chaga aberta no espírito segregacionista do Sul. Como explicar e tornar aceitável um cantor branco com voz de negro, roupa de negro, música de negro? Como evitar que ele trouxesse o negro para dentro da asséptica família branca americana? A muito custo e jogando com todas as influências de Sam Phillips, Elvis conseguiu um pequeno número na grande feira de música country de Nashville, a Grand Ole Opry. E foi aí que a família americana viu que o pior estava por vir.
Elvis e seus músicos subiram no palco lá no final do show, após uma série de estrelas country. Cabeça baixa, ele respondeu às perguntas do fosforescente apresentador com seu habitual "sim senhor", "não senhor". Quase um garoto normal. E então, meio tremendo de medo, começou a cantar "That's All Right". Medo, paixão, adrenalina, começou a dançar, a girar, a sacudir os quadris. As garotas gritaram, os garotos roeram as unhas, os mais velhos odiaram. Elvis foi banido do Opry. Mas a loucura tinha começado. "Na verdade eu estava tremendo feito vara verde" diria ele muito depois, "Não podia parar de mexer a perna, tinha de disfarçar. Aí saí dançando como costumava fazer em casa e no estúdio. Entre 54 e 56, Elvis e seu trio iam semear a loucura no comportado circuito country do sul. Metidos num furgão, rolando pelas estradas, tocando em rodeios, pátios de Igreja, escolas, festivais. Os avulsos da Sun iam vendendo regularmente e Elvis chegara a aparecer pela primeira vez na Billboard. Mas era ali, nas estradas do sul, que a loucura brotava. Eram os garotos, as meninas, os filhos de fazendeiros, vaqueiros da monolítica classe média sulista que lotavam qualquer local, com chuva ou sol, para ver Elvis requebrar, soluçar, girar os quadris, exibir sua versão caipira e instintiva do Rock'n'Roll. "Era uma loucura" lembra Scotty "Esses garotos surgiam ninguém sabe de onde, bastava fazer propaganda de boca, dizendo que Elvis ia tocar em tal lugar. As meninas, então, era inacreditável; choravam e chegavam a molhar as cadeiras"
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